segunda-feira, 23 de novembro de 2009

CONSIDERAÇÕES TELEVISIVAS

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O frio daqueles dias no litoral me meteu em contato meio forçado com a televisão. Mas a recepção, na praia do Grant, estava restrita a dois canais, num dos quais apenas se ouvia o som como que ecoando no interior de uma lata velha.

Periodicamente sou tomado por inexplicáveis acessos de generosidade. Desta vez adquiri uma antena parabólica e presenteei minha sogra. Juro que não fiz por mal. Eu não tenho nada contra ela, muito pelo contrário: a estimo muito e garanto que se todas as sogras fossem iguais (ou parecidas) haveria menos casais em crise. Por isto não seria capaz de lhe fazer ou desejar algum mal ou desfeita. Tanto que, agora, ela está passando uns tempos conosco, em Porto Alegre. Naturalmente que mais por causa da filha do que do genro.

Sinto-me protegido quando estamos sob o mesmo teto. Principalmente contra raios. Sou obrigado a abrir imensos parêntesis e jurar que se trata, obviamente, de uma brincadeira porque tenho dez cunhados, seis do sexo masculino, alguns verdadeiramente furiosos e grandalhões. Um deles já admitiu, num comentário aqui no blog, que foi abduzido e não tenho idéia dos poderes maléficos que essa abdução possa lhe ter conferido. Embora não acredite em discos voadores, tenho medo dos que viajam neles.

Mas enquanto eu ficava ao notebook manipulava esse invento maravilhoso que é o... controle remoto. Melhor que a televisão. Tenho um outro texto, mais antigo, com uma análise profundíssima a respeito, que publicarei em outra ocasião.

Nas repassagens pelos 26 canais disponíveis encontrei receitas culinárias de um minuto a duas horas, canais de venda, os inevitáveis canais abertos, e outros variados (nos dois sentidos). Muitos religiosos, mas sobre estes me reservo o direito de nada dizer. Minha sogra é devota da Rede Vida.

Há tanto programa de entrevistas com tanto entrevistado dizendo tantas certezas, num tom de voz convincente e definitivo, que eu ficava com pena de trocar de canal. Tive, muitas vezes, a sensação imediata de que o mundo estava salvo e que todos os nossos problemas, finalmente, resolvidos. Depois, com a direção crítica um pouco mais pensada, chegava à conclusão de sempre: pura futilidade e pretensão. A verdade tem tantos donos que não pode ser verdade!

Os programas infantis parecem se dirigir à finalidade específica de imbecilizar crianças. Mesmo esses ratimbuns da vida não achei tão educativos como apregoam. Em todos os casos, sou muito criança e deixo essa análise para os adultos. São estes que sempre decidem o que é melhor para os infantes.

Há os canais da Câmara e do Senado que transmitem bizarrices. Principalmente votações e CPIs. As inquirições de testemunhas são conduzidas de uma forma tão enviesada que, para alguém como eu, que passou grande parte da vida tentando ser o mais objetivo possível na técnica inquiritória da busca da verdade, tornam-se um tormento. Os inquiridores depõem mais que as testemunhas...

Os parlamentares são dotados de uma compulsão invencível de aparecer e pensam que são obrigados a perguntar à testemunha sempre. Mesmo sobre o que já está meridianamente esclarecido. Eu ficava inquieto e coçando. Gastei três tubos de Omcilon com as esfoladuras. Tinha ganas de ir lá e ensinar como é que se faz perguntas objetivas para obter respostas claras. Mas certamente teria que passar por uma sabatina e desisti. Se os juizes usassem das mesmas técnicas nas suas inquirições então sim vocês iriam ver o que é morosidade da Justiça.

Descobri algo interessante: os canais da Câmara e do Senado não veiculam os programas eleitorais gratuitos que os canais abertos são obrigados a transmitir...

Vamos ser justos. No do Senado há um programa excelente, de música erudita, conduzido pelo Arthur da Távola, e pude me deleitar um pouco.

E há os canais rurais. Gostei muito do Canal do Boi. Apenas lamento não tê-lo conhecido antes. Em casa tenho a DirecTV, mas nesta ele é pago e nunca quis assiná-lo.

Se o fizesse há algum tempo teria evitado uma tragédia. Sou proprietário de uma fazendola em Passo Manso, interior de Taió, e há uns dois meses perdi metade do meu rebanho por uma doença desconhecida. Agora tenho que me contentar com a única vaquinha que restou e dar graças a Deus por não ser um boi.

Bois não dão cria nem emprenham vacas – esse foi outro útil ensinamento do Canal do Boi.
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O que restou do meu rebanho.
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Publicado no Jus Sperniandi, do autor, no Uol,
em 11/08/2004.
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Um comentário:

  1. Pitacos transpostos do original:

    [Thiago] [thamos@uol.com.br]
    Olá, Ilton. Quanto tempo, hein. E o CD do Requiem? Já derreteu? : ) Estou um tempo afastado da Internet; procuro ficar o máximo do meu tempo livre distante do computador. Semana passada tive uma dor de coluna insuportável, por isso não posso abusar. Mudando de assunto... Faço coro ao comentário do Glauco. O texto está ótimo, muito gostoso e divertido. A Rede Vida é daqui mesmo. Acompanhei pessoalmente a construção da torre de transmissão, já visitei a emissora, que como ele diz, é muito boa. Também não sou católico, mas gosto de assistir às missas de Aparecida, principalmente pelos cânticos litúrgicos, muitíssimos bem acompanhados somente pelo órgão. Os programas de entrevistas como "Tribuna Independente" e "Prazer em Conhecê-lo" nos fazem esquecer, mesmo que momentâneamente, que existem pessoas tão vazias e desprezíveis na televisão, como Clodovil, João Kleber e cia. Saudações televisivas, Thiago.

    20/08/2004 17:23

    [Glauco Damas]
    Ilton, o post de hoje é um primor! "Delicioso", divertido... Dei umas risadas altas. Adorei especialmente você não acreditar em disco voador, mas temer quem viaja nele! E os Omcilons? ahhaha Voto no post de hoje como um dos melhores. // Curiosidade: a sede da Rede Vida fica aqui em minha cidade, São José do Rio Preto. Sabia? É um ótimo canal! Não sou católico, mas tenho mente aberta, aceito e respeito, sempre. Assisto e leio coisas de católicos, evangélicos, espíritas, da Seicho-no-ie (esqueci como se escreve!!!), etc., por isso sempre vejo alguma coisa da Rede Vida (às vezes até as missas). Vale a pena. É uma emissora séria. Só não gosto do canal "católico" (?) Canção Nova, que mais parece seita e só pensa em arrecadar milhões de reais todo mês(assustador!), mas a Rede Vida é excelente! Realmente, é "O canal da família", como diz o slogan.

    12/08/2004 20:17

    [Tell] [http://www.tagarela.blogger.zip.net]
    Ah Ilton, "fala sério, aí"... Programa eleitoral é uma excelente comédia, principalmente nas eleicões municipais, onde aparecem os esdrúxulos candidatos ao cargo de vereador, com seus slogans que "impressionam"... É pra gargalhar... mas só até o momento em que lembro que aquilo é real e a comédia vira tragédia!

    12/08/2004 13:19

    [Glauco]
    Um dia vai matar a coitada??? Pô! Do jeito que sou EXAGERADO com animais, eu nunca me daria bem com uma propriedade rural. Se tivesse criação de gado, todos iam morrer de VELHICE! E eu ainda ia agradar um por um! hehehe Até as galinhas, os coelhos, os peixes... :-)

    12/08/2004 20:21

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