sábado, 7 de setembro de 2013

QUEM TEM MEDO DE VIRGINIA WOOLF?


Gosto muito de filmes baseados em peças teatrais pela concisão e precisão dos diálogos. O autor teatral tem que ter um enorme poder de síntese porque a peça, que deve durar no máximo duas horas, enfoca, às vezes, uma vida inteira.  

Nisso o filme Quem tem medo de Virginia Woolf?, dirigido por Mike Nichols e cinco vezes oscarizado, é emblemático.  

Os diálogos são ricos e insólitos. O enredo é um jogo psicológico impiedoso entre o casal mais velho [Richard Burton (George) e Elisabeth Taylor (Martha)] e o mais novo [George Segal (Nick) e Sandy Dennis (Honey)], todos com atuações excepcionais. Mas depois de algum tempo não se sabe quem é gato e quem é rato porque os ataques se entrecruzam e mudam eficazmente de alvo.  

Tudo acontece numa única madrugada, após uma noitada festiva na casa do Diretor da Faculdade, pai de Martha, em que George e Nick são professores – este recém-chegado.  

O clima é de uma tensão degradante e de um sofrimento extremo. A falta de piedade é a característica principal de George, que tenta por todas as formas desqualificar o novel professor Nick, porque vê nele um provável sucessor e, além disto, rival na noitada, pois sua mulher não tem escrúpulos de seduzi-lo – e ele sabe disto. Ao mesmo tempo em que humilha a mulher dele, Honey, projetando-lhe de forma cruel as fraquezas de sua própria mulher, em quem também desfere ferinas e certeiras flechas de desamor.  

É surrealista em certos aspectos: há cenas de tensão que se transformam em comédia forçada, de riso imposto para se evitar o choro e outras em sentido inverso. Mas sempre as farpas trocadas atingem o ponto fraco de alguém, ainda que a figura escrachada de Martha pareça, inicialmente, imune às investidas do marido.  

O drama revela no casal mais velho uma capacidade superior e adquirida de ofender e espezinhar com precisão. Afeitos a brigas e desentendimentos, trocam desaforos e insultos, que às vezes parecem propositais e com o fim essencial de impressionar e sugestionar o casal jovem.  

O mistério do filho anunciado que não existe e que vai chegar, mas quem chega é um hipotético telegrama anunciando sua morte, e a reação dos pais, demonstra o cultivo de uma cara fantasia, no final desmascarada num jogo que chega às raias da mais pura desesperança. Mais um resquício de uma cumplicidade doentia foi quebrado.  

Amanhece, o casal mais novo vai embora, e vem a reconciliação sem conciliação de George e Martha e a sensação de que a vida foi vazia, é vazia e vai continuar vazia, ao contrário dos diálogos que são plenos de desesperança, de mágoas e ideais esmagados, reais ou imaginários, vividos ou criados por mentes insanas. Tudo leva à  conclusão de que são todos perdedores.  

O título é apenas referencial, embora haja quem diga que a peça, de Edward Albee (um sucesso da Broadway), foi inspirada em problemas existenciais semelhantes aos enfocados pela escritora inglesa Virginia Woolf. É uma espécie de trocadilho com o mote da história infantil do Lobo Mau e os Três Porquinhos e o nome da escritora. Os personagens, em várias cenas, cantam histericamente, “quem tem medo de Virginia Woolf?”, recordando uma brincadeira da festa anterior. Transportado para a nossa realidade superficial seria algo como “quem tem medo do Leão Lobo?“ (perdão, Virginia).  

O filme é em preto e branco mas se fosse colorido não conseguiria exprimir toda sua dramaticidade. O clima de desesperança que o perpassa de início ao fim, com uma música triste e sentida e perfeitamente adequada, não admite cores. Afinal, sonhamos – e temos pesadelos – em preto e branco.  
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