.
São cada vez
mais freqüentes as notícias de cidadãos de bem punidos por infrações muito
menos graves, puramente administrativas, do que os larápios que cometem delitos
às vezes pesados e têm o privilégio de aguardar anos e anos soltos até o
julgamento e muitas vezes, no final, são premiados com uma brilhante
prescrição.
Isto revela
uma face do Estado Brasileiro que destina valores elevados na instalação de
serviços em que pode sacanear o contribuinte e auferir um lucrozinho extra nem
sempre destinado para onde deveria, em detrimento de outras aplicações que nos daria
pelo menos uma sensação de maior segurança como a construção de presídios, por
exemplo. Mas esta é uma atividade não rentável, sem retorno financeiro e por
isto sem prioridade.
As multas de
trânsito são as meninas dos olhos brilhantes dos nossos governantes e sobre as
quais repousam cobiçosos anseios arrecadatórios. Na sua cobrança a atuação do
Estado é impecável. Nunca há falta de recursos e meios para arrecadar.
Infrator da lei
é um quase-bandido que infringiu alguma regra do Direito, a base
reguladora da ordem social, e por isto merece pena. Se você, num
domingo à tarde, no período de férias escolares, cruzar a 50 km por hora uma
lombada eletrônica defronte a um colégio fechado que estipula velocidade máxima
de 40 km, sofrerá uma multa de 120 UFIRs. Já se você esfaqueou seu vizinho e
produziu-lhe lesões leves poderá ser até perdoado ou pagar uma cesta básica
como pena e fica tudo por isto mesmo. É menos grave lesionar um vizinho – um
delito de resultado concreto – do que cruzar uma lombada eletrônica a 50 km por
hora sem risco a ninguém – uma infração administrativa sem resultado.
Um amigo meu
foi pego por um radar móvel a 97 km por hora na rodovia Tabaí-Canoas, que tem
três pistas em cada mão, num local onde, inexplicavelmente, a velocidade é
reduzida para 60 km por hora. Segundo ele, acompanhava, como muitos, o fluxo
normal de veículos no local naquele momento.
A infração é
considerada gravíssima porque o excesso de velocidade foi superior a 50% do
máximo permitido para o local. Além da pena pecuniária sofreu sete pontos na
Carteira de Motorista e interdição – e isto que me impressionou –, por dois
meses, do direito de dirigir.
A interdição
de direitos é, em muitos crimes, uma pena acessória dificilmente aplicada
porque se qualifica, na realidade brasileira de hoje, em pena muito severa. O
próprio nome já o diz: interdição de direitos. Significa que você será tolhido
em alguma atividade que tem direito de desenvolver, o que pode significar perda
de alguma oportunidade ou descontinuidade de afazeres que pode lhe acarretar
prejuízos e perdas irreparáveis.
Não se está
defendendo os infratores de trânsito. Estes devem ser punidos quando cometem
infração. Mas também não se os pode considerar bandidos apenas por isto. Por
estas razões, é injusta a desproporção da pena para quem, às vezes, comete uma
infração leve e sem colocar a vida de ninguém em risco em comparação com aquele
que comete um delito mais grave e acaba sendo perdoado.
A agilidade do
Estado em punir esses infratores e sua extrema lentidão em processar e punir os
verdadeiros larápios da nação, tanto aqueles que desviam para seus bolsos o
dinheiro público como aqueles que cometem furtos, roubos, assaltos, lesões corporais
e outros delitos capitulados no Código Penal e não são punidos, acaba por criar
uma situação iníqua.
Então,
punibilidade existe. Só que ela é capenga e não alcança a quem
preferencialmente deveria alcançar.
.