Publicada originalmente em 19/01/2006
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O síndico do
Condomínio do Edifício Brasil foi finalmente notificado pelo Delegado de
Polícia da cidade para prestar declarações em inquérito policial aberto contra
ele.
Havia
inicialmente suspeitas de desvio de dinheiro em sua gestão e a formação de um Caixa
2 para comprar o voto de condôminos em matérias de interesse de poucos, como o
aumento da contribuição dos mais velhos porque, em tese, eles já estariam mais
bem estabelecidos na vida.
Quem
denunciou as irregularidades foi o contador Beto, que assestou metralhadoras
principalmente contra os subsíndicos José Mercês e Obtúsio Aires. A este o
Síndico delegara funções próprias de um tesoureiro.
O síndico
tomou providências e exonerou a ambos de suas funções. Antes, chamou-os ao
escritório e prometeu recompensá-los se não o incriminassem pelas ilicitudes
cometidas.
O acordo
demorou um pouco. José Mercês usou toda sua força argumentativa tentando
convencer os demais a insistir veementemente em suas inocências, clamá-las em
todas as oportunidades que tivessem: dizia que uma mentira repetida à saciedade
acabava se tornando verdade.
– Vamos
dizer que eles vão ter que provar, a gente vai esticando o processo, vai
dizendo sempre, sempre, sempre, que é inocente e isto vai pegar. Um dia a gente
sai livre dessa, sem poblema.
Não
convenceu, mas acordaram que ele poderia seguir sua estratégia enquanto Obtúsio
assumiria a responsabilidade pelo Caixa 2 e por uma conta no Exterior que até
então era segredo.
Obtúsio
compareceu espontaneamente à Delegacia. Assumiu parte da culpa, mas nunca com
clareza. Chorou durante as declarações e disse que fora pressionado por
empresas que atendiam ao condomínio e que estavam descontentes com os baixos
pagamentos que recebiam. Ressalvou a total e irrestrita inocência do síndico
Duda, que não sabia de nada pois ele, como tesoureiro de fato, era quem
movimentava o Caixa.
Foi efetuada
uma perícia contábil e ouvidas testemunhas, mas não se esclareceu, realmente,
se o síndico tinha ou não ciência do rombo encontrado. Sérios indícios indicavam
que sim, mas não havia uma segurança tão absoluta que permitisse ao Delegado
enviar o inquérito ao Fórum indiciando o síndico e pedindo a abertura de ação
penal contra ele também; quanto a outros não havia dúvidas.
Por isto o
Delegado resolveu ouvir o síndico Ruiz Eduardo “Duda” da Silveira, e
notificou-o.
A inquirição
demorou mais de cinco horas. O síndico Duda era liso como uma lula e desviou-se
das armadilhas mentais e das perguntas capciosas que o Delegado fazia, embora
deixasse entrever que, efetivamente, não só tinha ciência como realmente
participara de tudo. Mesmo assim o Delegado, homem extraordinariamente
cauteloso, não ficou convencido. Ao fim da oitiva,
assinado o termo, despediu o síndico:
– Muito bem.
Está tudo certo então. Apenas por uma questão de lealdade, devo antecipar que
não vou indiciá-lo por falta de provas. O senhor está dispensado, muito
obrigado.
O síndico
agradeceu, dirigiu-se à saída, mas antes de fechar a porta voltou-se, e
perguntou, algo constrangido:
– Quer
dizer, então, que eu não preciso devolver o dinheiro?
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