sábado, 28 de novembro de 2009

UM VIOLINISTA NO TELHADO

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(Detalhe da capa do dvd nacional)
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Durante minha adolescência e parte da vida adulta detestei os musicais. Não entendia como, de repente, o personagem rompesse a seqüência de uma conduta linear e bancasse o idiota, passando a cantar, ainda que em relação ao enredo. Era ilógico.

Idem com números de danças quando dispensáveis. O filme não perderia nada sem esses números que privilegiam o artista em detrimento da história. Pura americanalhice – concluía – e saía do cinema às vezes antes do final. Assim, por exemplo, em Dançando na Chuva.

Depois que adquiri um hometheater (fiz um empréstimo na SICREDI para tanto), comprei alguns musicais, para testar o som, e conclui que nem todos são tão abomináveis quanto pareciam.

Um dos que assistira até o final, Um Violinista no Telhado, pedi que minha filha comprasse quando esteve em Londres (depois adquiri a versão lançada no Brasil).

A direção é de Norman Jewison, sempre seguro e objetivo. Os artistas são desconhecidos de grande parte dos cinéfilos. A maioria tem origem no teatro: trata-se de adaptação de um musical de grande sucesso na Broadway.

A ação se passa numa longínqua aldeia russa, Anatevka, onde convivem desconfiadamente judeus, em minoria, e russos, em setores – impossível chamar aquilo de bairros – separados, praticando pequenas e características mazelas.

O personagem principal é o leiteiro Tewye, pai de cinco filhas. As três mais velhas vão casando e rompendo tradições arraigadas. A cada rompimento um ingrediente novo e mais grave é introduzido e desespera o pai cioso de que as tradições devem ser mantidas porque constituem a base na vida em comunidade.

Tradição é o que dá equilíbrio à nossa alma – diz ele. Sem as nossas tradições a nossa vida seria tão instável como a de um violinista no telhado!

Seus monólogos com Deus são impagáveis, nem sempre conformados mas nunca revoltados: “Não é nenhuma vergonha ser pobre. Mas também não é nenhuma grande honra!” ou “Será que romperia um vasto plano eterno se eu fosse um homem rico?

A relativa paz familiar e comunitária é quebrada por injunções políticas. Por ordem do czar, os judeus são obrigados a abandonar a aldeia, retratando-se então uma partícula da diáspora.

Cada um procura o rumo melhor, conformado contra essa força superior e invencível. Na impossibilidade de resistir, vendem o que têm e buscam a América ou lugares mais distantes para viver.

Fica a lição: voluntária ou forçadamente, é possível quebrar tradições sem que este rompimento ocasione desvios irrecuperáveis ou causem à humanidade crises epilépticas irreversíveis. Foi quebrando tradições e fazendo revoltas que conseguimos algum progresso.

Pena que nem todas as lições são aprendidas. Nem outras mais graves e abrangentes, como na II Guerra Mundial. Se o fossem, certamente a situação no Oriente Médio seria outra e os perseguidos de outrora teriam mais compreensão com a sorte dos sem-pátria de hoje.

Mas a humanidade parece que não aprende e de hecatombe em hecatombe vai se destruindo e se reconstruindo logo à frente.

Voltando ao cinema: Dançando na Chuva – e agora vou arranjar briga com algumas amigas – é uma chatice mesmo.
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Publicado no Jus Sperniandi, do autor, no Uol,
em 31/08/2004.
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